por Ivan Pinheiro [*]
O Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro (PCB) saúda os partidos comunistas presentes, homenageando o anfitrião, o Partido Comunista Libanês, referência para todos os revolucionários e trabalhadores do mundo, com seu exemplo de luta sem tréguas contra o capital.
O aprofundamento da crise sistêmica do capitalismo coloca para o movimento comunista internacional um conjunto de complexos desafios.
Estamos diante de um estado de guerra permanente contra os trabalhadores, uma espécie de “guerra mundial”, na qual o grande capital busca sair da crise colocando o ônus na conta dos trabalhadores. Esta é uma guerra diferente das anteriores, que tinham como centro disputas interimperialistas.
Apesar de persistirem contradições interburguesas e interimperialistas na atual conjuntura, as grandes potências (sobretudo os Estados Unidos e os países hegemônicos da União Européia) promovem hoje uma guerra de rapina contra todos os países periféricos, sobretudo aqueles que dispõem de riquezas naturais não renováveis e contra todos os trabalhadores do mundo.
A guerra é o principal recurso do capitalismo para tentar sair da crise: ativa a indústria bélica e ramos conexos, permite o saque das riquezas nacionais e a queima de capitais; os capitalistas ganham também com a reconstrução dos países destruídos.
Os métodos são sempre os mesmos: satanização, manipulação, estímulo ao sectarismo e a divisões entre nacionalidades e religiões, cooptações, criação ou supervalorização midiática de manifestações e rebeldias, atentados de falsa bandeira.
Nesta guerra permanente, pelo menos nesta fase, têm sido poupados os chamados países emergentes, sócios minoritários do imperialismo, que legitimam a política das grandes potências, compondo, como atores coadjuvantes, o chamado Grupo dos 20.
Estes países (os chamados BRICS) se têm beneficiado da crise, na medida em que ajudam a superá-la; em seguida, poderão ser as próximas vítimas tanto da crise como de agressões militares.
Em nosso país, nunca os banqueiros, as empreiteiras, o agronegócio e os monopólios tiveram tanto lucro. A política econômica e a política externa do estado burguês brasileiro estão a serviço do projeto de fazer do Brasil uma grande potência capitalista internacional, nos marcos do imperialismo. As empresas multinacionais de origem brasileira, alavancadas por financiamentos públicos, já dominam alguns mercados em outros países, notadamente na América Latina.
Hoje, o governo brasileiro é o organizador da transferência da maior parte da renda e da riqueza produzida pelo país para as classes dominantes (através do superávit primário, da política de juros altos e do sistema tributário altamente regressivo). Cerca de 50% do orçamento se destina a pagar os juros e a amortização da dívida (externa e interna), para satisfação dos banqueiros internacionais e nacionais, assim como dos nossos rentistas (que não chegam a 1% da população).
Para atender aos interesses dos grandes empresários, das empreiteiras e do agronegócio, o governo promove a destruição do meio ambiente, desde o desmatamento da floresta amazônica à demolição da legislação ambiental. O novo Código Florestal brasileiro, um total desrespeito ao meio-ambiente, contou com o apoio de partidos que se dizem de esquerda, mas se caracterizam por um esvaziamento ideológico, pela adesão às medidas neoliberais e por se curvarem aos ditames do imperialismo. Em períodos eleitorais, rebaixam ainda mais o discurso e abandonam os símbolos que vagamente os ligam ao ideário socialista.
Em meio a esta grave crise, e sem a consolidação ainda de um importante pólo de resistência proletária, o capital realiza uma violenta ofensiva para retirar dos trabalhadores os poucos direitos que lhes restam. Para fazê-lo, tentam cada vez mais fascistizar as sociedades e criminalizar os movimentos políticos e sociais antagônicos à ordem. A correlação de forças ainda nos é desfavorável. Ainda sofremos o impacto da contra-revolução na União Soviética e da degeneração de muitos partidos ditos de esquerda e de setores do movimento sindical.
Por outro lado, estamos muito preocupados com o verdadeiro cerco militar que o imperialismo promove na América Latina. Realmente, a reativação da IV Frota norte-americana, com um poderio bélico maior do que a soma de todas as forças armadas dos países latino-americanos, traz ameaças à soberania e à paz na região. O estabelecimento de dezenas de bases militares dos EUA na América Latina inquieta os latinoamericanos. A considerar ainda a construção de um aeroporto militar ianque na cidade de Mariscal Estigarribia, no Paraguai, que possibilita o controle da região da tríplice fronteira (Brasil, Argentina e Bolívia) e onde se assenta a maior reserva mundial de água doce, o Aquífero Guarani.
Mas não é só o imperialismo estadunidense que cerca a Nossa América. A OTAN construiu, em 1986, na Ilha Soledad do Arquipélago das Malvinas, a grande base militar de Mount Pleasant, que dispõe de aeroporto e porto naval, de águas profundas, onde atracam submarinos atômicos e foram construídos silos para armazenar armas nucleares e instalações para aquartelar milhares de efetivos militares. Essa fortaleza das Malvinas contraria, expressamente, o contido na Resolução 41 da ONU, que considera o Atlântico Sul zona de paz e cooperação, isenta de armamentos e engenhos nucleares.
A considerar, ainda, a ilha de Ascensão, outra base militar da OTAN que fica a meio caminho da costa brasileira e da costa africana.
A OTAN criou uma zona de exclusão pesqueira de mais de um milhão de quilômetros quadrados em torno das ilhas Georgia e Sandwich do Sul, destinando essa zona exclusivamente às suas forças bélicas.
A ocupação militar imperialista no Atlântico Sul permite o controle das rotas marítimas que unem a América do Sul à África e sua conexão com o continente da Antártica e com os países do Pacífico, através do Estreito de Magalhães. Ademais, permite o controle dos inúmeros recursos naturais da plataforma continental da América do Sul. É assim que a América Latina está cercada por terra e por mar pelas forças militares imperialistas, com a omissão da grande maioria dos governos locais.
Analisando este quadro, o PCB tem feito algumas reflexões.
Nos marcos da ordem burguesa, o futuro é sombrio. Mais do que nunca o regime do capital virá acompanhado de crescente instabilidade econômica, absoluta irracionalidade no uso e na distribuição da riqueza, escandalosa desigualdade social, escalada da prepotência imperialista e inexorável perigo para as conquistas populares e dos trabalhadores.
A nosso juízo, não há mais espaço para ilusões reformistas. Aliás, os reformistas, mais do que nunca, são grandes inimigos da revolução socialista, pois iludem os trabalhadores e os desmobilizam, facilitando o trabalho do capital. Em cada país, as classes dominantes forjam um bipartidarismo – em verdade um monopartidarismo bicéfalo – em que as divergências, cada vez menores, se dão no campo da administração do capital.
Cada vez mais também faz menos sentido a “escolha” de aliados no campo imperialista e mesmo entre seus coadjuvantes emergentes, como se houvesse imperialismo do “bem” e do “mal”. A diferença é apenas na forma, não no conteúdo. Isto não significa subestimar as contradições que vicejam entre eles.
Não podemos conciliar com ilusões de transição ao socialismo por vias fundamentalmente institucionais, através de maiorias parlamentares e de ocupação de espaços governamentais e estatais. A luta de massas, em todas as suas formas, adaptada às diferentes realidades locais, é e continuará sendo a única arma de que dispõe o proletariado.
Temos avaliado também que o atual modelo de encontros de partidos comunistas e operários, que vêm cumprindo importante papel de resistência, precisa se adaptar às complexas necessidades da conjuntura mundial, com suas perspectivas sombrias no curto prazo e suas possibilidades de acirramento da luta de classes, com a emergência das lutas operárias.
Pensamos que é preciso romper com o “encontrismo” em que, ao final dos eventos, nossos partidos formulam um documento genérico e decidem a sede do próximo encontro e se despedem até o ano seguinte, inclusive aqueles dos países da mesma região.
Para potencializar o protagonismo dos partidos comunistas e do proletariado no âmbito mundial, é necessária e urgente a constituição de uma coordenação política que, sem funcionar como uma nova internacional, tenha a tarefa de organizar campanhas mundiais e regionais de solidariedade, contribuir para o debate de ideias, socializar informações sobre as lutas dos povos.
Mas, para além da indispensável articulação dos comunistas, parece-nos importante a formação de uma frente mundial mais ampla, de caráter antiimperialista, onde cabem forças políticas e individualidades progressistas, que se identifiquem com as lutas em defesa da autodeterminação dos povos, da paz entre eles, da preservação do meio ambiente, das riquezas nacionais, dos direitos trabalhistas, sociais e políticos; contra as guerras imperialistas e a fascistização das sociedades. Em resumo, as lutas em defesa da humanidade.
Deixamos claro que o nosso Partido valoriza qualquer forma de luta. Não podemos cair no oportunismo de fazer vistas grossas ao direito dos povos à rebelião e à resistência armada. Em muitos casos, esta é a única forma de fazer frente à violência do capital e de superá-lo. Os povos só podem contar com sua própria força.
Saudamos os povos que hoje enfrentam as mais duras batalhas. Saudamos os trabalhadores gregos, portugueses, espanhóis, que já se levantam em greves nacionais e grandes jornadas e os demais trabalhadores da Europa, que enfrentam terríveis planos do capital para tentar superar a crise, hoje mais acentuada no continente europeu mas que poderá agravar-se e espalhar-se para outros países e regiões.
Saudamos o povo palestino, em sua saga duradoura e dolorosa no enfrentamento ao sionismo que o sufoca e reprime, ocupa seu território, derruba suas casas, prende seus melhores filhos e impede seu direito a um Estado soberano.
Valorizamos o cessar-fogo celebrado recentemente no Egito, como uma vitória importante mas parcial da resistência palestina em Gaza. O sionismo - cuja intenção era claramente mais uma vez invadir Gaza com tropas e tanques - surpreendeu-se com a atual capacidade de reação militar palestina neste pequeno, isolado e sofrido territorio, de fato sob ocupação israelense: uma reação à altura das necesidades de autodefesa e da ampliação dos direitos do povo palestino.
Mas não podemos, de maneira alguma, subestimar a agressividade do imperialismo e do sionismo, que não desistirão de seu intento de dobrar a combatividade e destruir a identidade do povo palestino, ocupando todo seu territorio, como parte do plano expansionista que chamam de “Novo Oriente Médio”.
No entanto, a considerar a justa e proporcional reação do povo de Gaza e a extraordinária solidariedade internacional à luta dos palestinos, melhoram as condições de resistência aos planos sionistas.
E aqui pedimos a manifestação deste encontro em solidariedade à realização na próxima semana, no Brasil, do Forum Social Mundial Palestina Livre, que vem sofrendo ameaças da comunidade sionista em nosso país, inclusive, em desrespeito à soberanía brasileira, por parte da representação diplomática israelense.
Da mesma forma, saudamos os também sofridos povos do Iraque, do Afeganistão, da Líbia. Saudamos os povos do Egito, do Iêmen e de vários países árabes, em sua luta contra a tirania e a opressão.
Saudamos sírios e iranianos, contra os quais batem os tambores de guerra do imperialismo. Nosso Partido está incondicionalmente solidário à grande maioria do povo sírio e a seu direito à autodeterminação. Como na Líbia, trata-se na Síria do plano imperialista de fomentar guerras civis sectárias, valendo-se de mercenários e equipamentos militares estrangeiros, para dividir e ocupar o país. No caso da Síria, procura o imperialismo criar condições para uma posterior agressão militar ao Irã.
Solidarizamo-nos com os comunistas, os trabalhadores e as forças antiimperialistas libanesas diante da movimentação de setores da burguesía nacional aliados ao imperialismo, que procuram fomentar uma nova guerra civil, no contexto da divisão dos países do Oriente Médio por criterios sectários e religiosos, para facilitar a recolonização da região.
Chegando até nossa América Latina, saudamos nossa querida Cuba Socialista em sua luta contra o cruel bloqueio ianque. Saudamos nossos Cinco Heróis. Saudamos os processos de mudanças na América do Sul (Venezuela, Bolívia e Equador), neste momento decisivo, uma encruzilhada entre o avanço dos processos ou sua derrota.
Saudamos nossos irmãos colombianos que, nas cidades e nas montanhas, resistem, através de variadas formas de luta, contra o estado terrorista de seu país, a grande base militar norte-americana na América Latina. Saudamos os revolucionários colombianos, na expressão de seu partido comunista e guerrilhas.
Não há solução militar para o conflito colombiano. Por isso, saudamos os diálogos que têm como objetivo buscar uma solução política. Este diálogo só foi possível pelo surgimento e desenvolvimento da Marcha Patriótica, um combativo e amplo movimento de massas, e pela constatação da impossibilidade de vitória militar do estado contra a guerrilha.
Sabemos que não será simples este diálogo, pois as classes dominantes colombianas e o imperialismo querem a paz dos cemitérios. Assim sendo, propomos que este Encontro assuma a organização de uma campanha mundial de solidariedade ao povo colombiano por uma verdadeira paz democrática com justiça social e econômica
Finalmente, reiteramos nossa proposta de criação de coordenações políticas internacionais e regionais dos Partidos Comunistas, tendo como princípio fundamental o internacionalismo proletário.
Beirute (Líbano), 22 de novembro de 2012
PCB – Partido Comunista Brasileiro
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