10 de abr. de 2010

Acusam-nos de terrorismo:


Acusam-nos de terrorismo:
se defendemos a mulher e a rosa o poderoso verso…
e céu de anil…
Mas… aqui tudo se foi
Não resta água, nem ar… Nem tenda, nem camelo
e nem o escuro café árabe!!

Acusam-nos de terrorismo:
se escrevemos a ruína de uma terra arruinada dilacerada, fraca…
um lar sem endereço
uma nação sem nome

Um lar que nos proíbe de ler jornais e de ouvir as notícias.
Um lar onde os pássaros são proibidos de cantar.
Um lar onde, pelo terror [ru'b], acostumamo-nos a escrever
sobre nada.

Um lar à imagem da poesia de nossas terras: Conversa fiada,
nenhum ritmo,
coisa importada,
congestionada, rosto e língua tratantes: Nenhum começo
Nem fim
Nenhum interesse pelo povo
nem pela mãe terra
ou pelas crises da humanidade…

Um domínio…
que chega aos diálogos de paz sem honra
e de pés descalços.

Um lar
onde homens mijam nas calças…
e é deixada às mulheres a defesa da honra.

Sal em nossos olhos
Sal em nossos lábios
Em nossas palavras… sal
Poderá alguém suportar tanta aridez?
Será esta a herança do estúpido Qahtan?
Nessa nação, nem Muawia nem Abu Sufian
Ninguém, ninguém para dar um basta
ninguém para peitar a escória
Entregaram nosso pão, nossos cavalos, nosso azeite.
Reduziram a quinquilharia nossa história.

Não resta poesia em nossa vida,
desde que nos desvirginamos na cama do Sultão.

Acostumaram-nos à humilhação
que é só o que resta ao homem quando o que sobra
é desgraça.

Procuro em livros de história
Ussamá ibn al-Munqith
Uqba ibn Nafi
Ornar e Hamzá
e Kalid, arrebanhando os seus à conquista do Shem.
Procuro um Mutassim Bilá
que salve as mulheres da selvageria da curra
e do fogo.

Procuro pelo homem de hoje
E tudo o que vejo são gatinhos com medo
Cujas próprias almas se apavoram
com um sultanato de ratos.

Será tudo uma esmagadora cegueira nacional?
Somos incapazes de enxergar as cores?
Acusam-nos de terrorismo
se recusamo-nos a morrer
com os tanques de Israel
rasgando nossa terra
rasgando nossa história
rasgando nosso Evangelho
rasgando nosso Alcorão
e o túmulo de nossos profetas
E se este foi nosso pecado,
Pasmem: não é belo o terrorismo?

Acusam-nos de terrorismo:
se recusamo-nos a ser apagados
por mãos de mongois, judeus e bárbaros
se jogamos uma pedra
na vidraça do Conselho de Segurança
depois que o César dos Césares o tomou para si.
Acusam-nos de terrorismo
Se recusamo-nos a negociar com o lobo
e a cumprimentar prostitutas.

Estados Unidos da América
Contra as culturas dos povos
porém sem cultura
Contra as civilizações civilizadas
Mas sem civilidade
Estados Unidos da América
Um poderoso edifício
sem paredes!

Acusam-nos de terrorismo
se defendemos nossa terra
e a honra do chão…
e revoltamo-nos por sua honra
quando abusam de n6s e de nosso povo
e acusam-nos
se protegemos as últimas palmeiras do nosso deserto
as últimas estrelas do nosso céu
a última sílaba de nossos nomes
e o último leite do seio materno
e se este foi nosso pecado
como é belo o terrorismo.

Apoio o terrorismo
se ele pode salvar-me
dos imigrantes da Rússia e da Romênia
da Hungria e tia Polônia

Ocuparam a Palestina
cravando os pés em nossos ombros
para saquear os minaretes de al-Quds e a porta de Aqsa
para roubar as cúpulas
e os arabescos.

Antigamente
Ardia a rua nacionalista
como um cavalo selvagem.
E os rios transbordavam juventude.

Mas após Oslo
ficamos banguelas:
e agora, perdidos e cegos.

Acusam-nos de terrorismo:
se defendemos com todas as forças
nossa herança poética
nosso muro nacional
nossa rósea civilização
a cultura flautística em nossas montanhas
e os espelhos que refletem olhos de ébano.

Apóio o terrorismo
se ele pode libertar um povo
da tirania e dos tiranos
e salvar o homem da crueldade humana
se ele pode trazer de volta o limão e a oliveira
o pássaro ao sul do Líbano
e o sorriso da Golã

Apóio o terrorismo se ele me salvar
do César de Yehuda
e do César de Roma
Apoio o terrorismo enquanto esta nova ordem
for partilhada meio a meio entre Israel
e Estados Unidos.

Apoio o terrorismo
com toda a minha poesia
com todas as minhas palavras
e todos os meus dentes
enquanto este novo mundo
estiver em mãos de açougueiro.

Apoio o terrorismo
se o Senado americano
encena julgamentos
decreta prêmio e punição.

Apoio o Irhab [terrorismo]
enquanto esta nova ordem mundial
odiar o cheiro do árabe.

Apoio o terrorismo
enquanto a nova ordem mundial
quiser massacrar nossos descendentes
e atirá-los aos cães.
E é por tudo isso
que elevo minha voz às alturas:
defendo o terrorismo
estou com o terrorismo
apoio o terrorismo …

Nizar Qabbani
[Londres, 15 de abril de 1997]

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